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BLOGUE DO MINHO

Espaço de informação e divulgação da História, Arte, Cultura, Usos e Costumes das gentes do Minho e Galiza

BLOGUE DO MINHO

Espaço de informação e divulgação da História, Arte, Cultura, Usos e Costumes das gentes do Minho e Galiza

BRAGA / RUSGA DE S. VICENTE: O CHAPÉU BRAGUÊS É UMA MARCA CARACTERÍSTICA DA TRADIÇÃO BRACARENSE. A COR AVERMELHADA TINHA A VER COM A OCASIÃO E IDADE DE QUEM O USAVA! – FOTO DE ABEL CUNHA

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A chapelaria no Minho tem uma forte tradição, especialmente ligada à fabricação do "chapéu braguês" Consiste num chapéu de copa alta e aba larga que se tornou um ícone do Minho e era amplamente utilizado no século XIX.

Embora a indústria chapeleira tenha-se transferido em grande parte para S. João da Madeira, onde hoje se encontra o Museu da Chapelaria, o chapéu braguês continua a ser um símbolo cultural da região, frequentemente usado por grupos folclóricos.

A indústria chapeleira floresceu em Braga, particularmente na Freguesia de São Víctor.

O chapéu braguês era um chapéu de uso diário, reconhecível pela sua copa alta e aba de cerca de sete centímetros, que se tornou um elemento distintivo do traje de lavradores e outras pessoas da região.

COSTUMES DO MINHO: A CASTREJA E O JANGAREIRO

Mulher de Castro Laboreiro

Publicou a revista Ilustração Portugueza, na cada da sua edição de 17 de março de 1913, duas interessantes fotografias que mostra os trajes da mulher do Soajo e do jangareiro de Anha ou seja, aquele que conduzia a jangada do sargaço na travessia do rio Lima, envergando a tradicional branqueta do sargaceiro. O texto que acompanha as fotos possui também algumas particularidades curiosas que refletem bem a distância que então separava o jornalista habituado ao meio burguês e citadino em relação à profundeza da vida rural que de mais interessante apenas proporcionava os motivos pitorescos com que ilustrava as páginas dos jornais. Transcreve-se o artigo respeitando-se a grafia original.

Costumes Portugueses

Em luta constante com a natureza, a quem arrancam após porfiadas canceiras as matérias primas que lhe fornecem o fato e o alimento, únicos produtos das rudimentares industrias que exercem: a pastorícia e a agricultura, os montanhezses de Castro Laboreiro são uma pobre gente desconfiada e semi-selvagem.

O vestuário das suas mulheres dá á primeira vista ideia lucida e sugestiva de toda a sua rudeza: capucha ou mantela, o corpete e a saia, é tudo feito de tecido grosseiro de fabrico local a que chamam burel ou picoto. Os tamancos toscos, espécie de sandálias, formadas por rudes madeiros ligados aos pés por correias fortes, chamados chancas ou alabardeiros, completam o vestuário das castrejas, em que as roupas brancas faltam por completo.

Na mesma província do Minho, á beira mar, o fato simples usado pelos jangadeiros d’Anha, emparceira admiravelmente com a rudeza semi-selvagem do vestuário das castrejas.

É muito característico o tipo destes lavradores-marinheiros, que nas costas do norte, principalmente junto a Viana do Castelo, e, por todo o litoral desde Montedor até à costa do sul do Lima, no local denominado Anha, se aventuram ao mar, a fim de colher o sargaço, moliço ou limos, como lhe chamam, com que vão depois fertilizar as suas terras navegando sobre frageis jangadas, formadas por oito troncos de madeira muito leves ligadas a maneira de estrado, tendo lateralmente duas taboas dispostas em forma de borda falsa: os troncos das bordas são mais compridos, e, levantam em forma de rabo d’arado.

Vestem unicamente uma espécie de sobrecasaca de lã grossa e forte, o que chamam branqueta, presa com um cinto e abotoada na frente, uma carapuça vermelha ou um chapéo preto de grandes abas completam tão singular vestimenta.

A. Mesquita de Figueiredo

Um jangadeiro minhoto | (Clichés do distinto amador sr. J. Albino Pereira de Carvalho)

 

FEIRAS NOVAS DE PONTE DE LIMA: O QUE DISSE O ETNÓGRAFO VIANENSE CLÁUDIO BASTO A PROPÓSITO DA MULHER DO MINHO? – FOTO DE SÉRGIO MOREIRA & SÍLVIA MOREIRA

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Sob o título “A Mulher do Minho”, o etnógrafo vianense Cláudio Basto publicou um interessante artigo, na edição nº 13/15, de Jan/Mar de 1924, da revista “Alma Nova”, o qual seguidamente se reproduz. O artigo é ilustrado com desenhos de Couto Viana.

“A denominação provincial de “Minho” não corresponde, em boa verdade,a  uma região distintamente definida, diferenciada, - nem a ideia vulgar a respeito deste Minho corresponde com exactidão á realidade.

Em regra, associa-se a Minho a ideia de campos, milharais, cortados ou emmoldurados de videiras, e ao longe manchas de pinhais que alastram pela ondulação dos montes.

O Minho, porém, não oferece um aspecto uniforme. Quem o quiser conhecer, ter dele uma rigorosa noção de conjunto, dever-lhe há percorrer as margens dos rios, a beira-mar e as montanhas. Verá como a província é de  aspecto vário, de vário pinturesco. Verá o contraste entre as margens harmoniosas, luminosas, de um Lima sereníssimo, e as margens ásperas de um Coura, a saltar por meio de alcantis, espécie de Corgo que vai, não rugindo espumas – é certo –, mas gargalhando, contente do verdume que lhe adorna e adoça as asperezas do vale… Verá a estrada de Viana até Caminha, a correr perto do mar, numa veiga plana, fértil até à babugem das ondas, – e a estrada corcovada que de Monção leva aos Arcos-de-Valdevez, aberta na ilharga de um vale fundo, majestoso, amparado por montanhas íngremes, mas em que os barrancos são emplumados de vegetação e em que os próprios penedos, enormes, de formas curiosas, parece havê-los Posto ali a natureza num poético jeito de arte… Verá as paisagens das serranias: lugares ermos, lugares povoados, terras de cultivo… Verá, enfim, espectáculos diferentes, bravezas e jardins, – mas por toda a parte dominará a cor verde, em tons inúmeros, desde o verde tam verde dos Linhares até ao verde-amarelo das vinhas e ao verde-negro dos pinheiros…

O verde – o riso da terra – é a característica, para assim dizer, da região minhota, – porque sempre a linda cor, em mil gradações, nos altos e nos baixos, por montes e vales, surge como promessa de alegria e fertilidade.

Olhando, porém, para fora dos limites políticos do Minho, alongando a vista por terras durienses, terras irmãs se divisam, – dando razão aos que, noutros tempos, se casavam a todas num lógico Entre-Douro-e-Minho, a região Verde de Portugal! (Sem falar, claro é, nas terras de além do Rio Minho, – por onde a nossa província afigura prolongar-se…)

A ideia vulgar a respeito do “Minho” não corresponde, pois, com rigor à verdade, – nem tal denominação corresponde, por maneira alguma, a uma região nitidamente diferenciada.

Abstraiamos, no entanto, do artifício dos limites minhotos, – pois que esta província é, no território interamnense, a porção de terra predominante e que afinal o caracteriza.

Assim, como não há um Minho de aspecto uniforme, também não há um tipo de minhoto, – um tipo de mulher minhota, no caso restrito de que neste momento se trata.

Os elementos raciais, primitivos e supervenientes misturaram-se em diversas proporções: confundiram-se aqui, além; prevaleceram uns ou outros, salientes, ali, acolá; – não há um tipo humano definido, normal, em última análise. Nuns pontos, como em Castro-Laboreiro, – freguesia insulada lá longe, entre serras, – há representantes da raça pequena dolicocefálica que forma o núcleo autóctone da gente portuguesa; noutros pontos do Alto-Minho há representantes da raça braquicefálica de Grenelle; noutros lugares, como em Afife, em Ponte-de-Lima, notam-se representantes da raça nórdica… Sítios há, como em Perre, nos quais, – por se efectuarem os casamentos quási só entre a sua população, obediência a um velho uso tradicional, – a população adquiriu e mantém caracteres especiais, locais, inconfundíveis.

A antropologia minhota, a não ser em poucas e limitadas regiões, está sem estudar. O estudo antropológico da província, completo e metódico, ratificará por certo largamente o que deixo dito, mal fincado na minha superficial observação e nos parcos elementos que Fonseca Cardoso nos ministra respeitantes ao caso.

Á luz da sciência não há, pois, um tipo de mulher minhota, – e  não o há comàticamente, como o não há nas maneiras, na cultura, nem sequer no vestuário…

Desde a castreja rude, com a sua escura saia de fuloado, o seu singuidalho, a sua capela na cabeça e as suas chancas de pau atadas aos pés por correias, até à afifana, branca e bonita, esbelta e flexuosa, perfeitamente senhoril no seu vistoso traje aldeão e na sua breve chinelinha, há um sem-número de tipos femininos.

Mas se, em tais condições, não podemos conseguir um tipo, podemos criá-lo psicologicamente, à custa do interior, do íntimo das mulheres minhotas: pela sua actividade intensa e tenaz, pela sua resistência a fadigas sem conto, pela sua alegria tantas vezes ruidosa, – pelo seu trabalho contente, enfim.

Se o verde é a cor característica da terra minhota, o trabalho – o trabalho contente – é a qualidade característica da mulher do Minho.

(Vamos supondo que realmente existe um Minho…)

No perfil da minhota, ainda podereis achar típico o seu amor ao “ouro” – com que se enfeita exuberantemente e onde entesoura os seus capitais, o seu dote de noiva, as suas economias de esposa e mãe – o seu apego aos arraiais, onde namora, canta e baila por tempo esquecido; a sua predilecção por cores vivas, “berrantes”, com que, sobretudo no concelho de Viana, garridamente se veste – mas o que na Mulher minhota achareis acima de tudo, como verdadeiramente típico, é o seu amor ao trabalho, que executa satisfeita, alegre.

É vê-la em casa: cozinhando, fiando, tecendo o linho, a estopa ou a lã; compondo a roupa; preparando o cesto para ir feirar e “armar” o dinheiro preciso para os “arranjos”… É vê-la fora de casa: nos moutes, à caruma, à carqueja, às pinhas, ao mato; no desabrigado dos campos, amanhando a terra ou apascentando o gado; no mar, entre os penedos, toda molhada, apanhando o argaço para estrumar as terras; pelas estradas, guiando o carro-de-bois e às vezes fiando simultaneamente para melhor “aproveitar o tempo”; e até em serviços de carga e descarga de navios e vapores, de comboios e carros, entregue a labutas pesadas, pesadíssimas…

E sempre cantando, sempre satisfeita e alegre!

Canta durante o trabalho; canta ao ir par ao trabalho; canta à tardinha, leve e ligeira, recolhe a casa!

Não é, todavia, apenas assim que a minhota ajuda o homem – ou, equivalente, o substitui.

Pode o homem ir para longe, para a Espanha, para a França, para o Brasil, para a Califórnia, para o inferno – que a mulher ficará em casa não só dirigindo oss serviços domésticos, tratando dos velhos e das crianças, mas ainda olhando pelos bens, cuidando das terras, atendendo solícita, de mótu-próprio, sozinha, a tudo, a tudo, sem sacrifício, com prazer, cantando – e só por vezes, ao clarão vermelho do sol morrente, nesse canto que evola do seu coração a saudade de Aqueles que longe, lá muito longe, em terras estranhas, também moirejam por ela e para ela…

Viana-do-Castelo | 18-Outubro-1923 | Cláudio Basto”

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VIANA DO CASTELO: PORQUE OURA A MULHER DO MINHO DE FORMA TÃO EXUBERANTE? – FOTO DE SÉRGIO MOREIRA & SÍLVIA MOREIRA

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É frequente algumas pessoas de diferentes regiões do país, ligadas ao meio folclórico, questionarem-se acerca da exuberante exibição do ouro em terras minhotas, lembrando as dificuldades com que o povo outrora vivia.

A atracção das nossas gentes por esse metal tão bonito quanto precioso remete-se aos confins da nossa História, ao tempo em que as nossas mulheres se adornavam com torques e braceletes que inspiram a moderna ourivesaria minhota. Os próprios romanos chegaram a explorar as abundantes jazidas existentes na nossa região. Contudo, a importância do ouro na tradição minhota possui uma exlicação bem mais recente!

No meio rural, aliás à semelhança do meio urbano, existiam várias classes sociais de camponeses (na cidade, de burgueses!) ou seja, havia desde os mais abastados até àqueles quem praticamente nem propriedade para cultivar possuíam, sendo por isso forçados a trabalhar ao jornal por conta de outrem.

Na região de Entre-o-Douro e Minho, muitos camponeses foram obrigados a emigrar para o Brasil para escapar à miséria que então assolava os campos. Não raras as vezes escapavam clandestinamente escondidos nos porões dos navios que partiam de Viana do Castelo ou outros portos.

Porém, muitos deles regressaram ricos, construíram os seus solares e casas apalaçadas, as chamadas as casas dos brasileiros, sobretudo ao longo do litoral minhoto. Eram os “brasileiros de torna-viagem”.

Do seu bolso ajudaram a construir escolas, beneficiaram igrejas e de um modo geral contribuíram para o progresso das suas terras de origem. Mas também não esqueceram as suas afilhadas, oferecendo-lhes geralmente um rico dote em oiro para que também elas viessem a conseguir um bom casamento... é isso que em grande medida explica uma exibição mais exuberante do ouro nesta região em contraste com outras regiões do país!

Em relação à exuberância, tal constitui um traço do carácter minhoto que define bem a sua personalidade. Longe da monotonia de outras terras, o minhoto vive desde que nasceu rodeado de uma paisagem alegre e deslumbrante onde a grandeza das montanhas contrasta com a doçura verdejante das suas veigas. Por isso, ele é jovial e alegre. E, todos os momentos da vida, incluindo os mais difíceis, enfrenta-os com um sorriso nos lábios. O trabalho, a religião e a própria gastronomia são vividos em festa! A sua enorme paixão pelo fogo-de-artifício e a forma como decora os arcos de romaria são disso um exemplo… como poderia ser de outro modo o seu gosto pela ourivesaria?

Foi também esta procura pelos objectos de adorno em ouro que permitiu o desenvolvimento da ourivesaria sobretudo em Gondomar e Póvoa de Lanhoso, fazendo desta arte um dos ex-líbris de Portugal mundialmente reconhecido.

VIANA DO CASTELO: A MULHER DO ALTO MINHO – FOTO DE SÉRGIO MOREIRA & SÍLVIA MOREIRA

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O celeiro do Alto Minho é Coura, terra das papas, paraíso da boroa. Como por lá o terreno é mais fundo e húmido, as colheitas fazem-se no S. Martinho, e sangra-se Cristo sem escrúpulo. São as martinhadegas. Parece que o nome explica os usos. E de facto explica. As mulheres entram com os homens nas malhadas e com eles manejam, alternadamente, os manguais. Nos terrenos menos fundos e mais secos, pelo leste do Minho, as malhadas fazem-se mais cedo: e mais cedo ainda, em Setembro, pelo S. Miguel (dia santo em todas as aldeias minhotas), faz-se a esfolhada. Esfolhear o milho consiste em descamisar-lhe a espiga. Devia ser um trabalho enfadonho. Pois não é. Por toda a parte é uma pandega de truz. No coberto ou na eira reúnem-se os vizinhos à gente da casa, e não faltam à festa as cachopas bonitas com os seus conversados. Sentam-se todos no chão ou onde Deus quer, numa grande roda. Canta-se ao desafio, conversa-se e quando aparece o milho-rei corre o seu possuidor a roda a colher abraços da sociedade. Às vezes irrompe do escuro uma mascarada pitoresca. Dança-se e ceia-se. Come-se bacalhau ou sardinhas, a boroa, um caldo de couve com feijão; bebe-se a pinga do Senhor; e, como às vezes o amor e o vinho fazem suas, não é raro acabar tudo à meia noite com muita pancadaria. Nas malhadas de centeio, mais montanhesas, cada infusa de verde é acolhida com vivas desengonçados a que chamam apupos. Mas quanto mais os manguais trabalham mais a fome aperta. Por isso, antes do meio-dia, cai na cozinha um grupo de malhadores, cocando a comida ou as mulheres. Mas estas não são pecas: brigam com eles — defendendo-se a tição, com a pá do forno, a braço, como calha — e expulsam-nos para a eira com grande alarido. Ao arrumar da palha, arma-se um mono representando uma velha a cujo enterro se procede imediatamente, indo atrás o viúvo como carpideira.

Não são estas, porém, as únicas festas agrícolas da região. Há as lavradas pela Páscoa. E em Junho, foucinha no punho, lá vai tudo para as veigas segar o trigo e o centeio. Depois da apanha do linho, faz-se também, pelo S João, a espadelada. Todas as cachopas, com o seu cortiço ao lado e de espadela na mão, trabalham como formigas e cantam como cigarras. Vão-se chegando os rapazes, que se prantam de roda, encostados aos varapaus. Surge, de repente, o tocador, com o cavaquinho ou o harmónico; e lá se abandonam os cortiços e se pousam as espadelas, porque já as moças, a mailos moços — vira que vira, entram na dança, de mãos erguidas, enquanto os velhos saboreiam a pinga, limpando a boca às costas da mão. Nas vindimas canta-se também, está visto, mas, depois das maceiras terem deitado as uvas nas dornas ou nos lagares, o mulherio retira-se prudentemente, porque o resto, cá no Minho, é só para homens. São os homens, de calças arregaçadas, e alguns mesmo sem calças, que vão pisando os cachos, enquanto a ceia se faz e a vela de sebo dura acesa.

O Inverno aproxima-se, com o seu cortejo de chuvas e ventanias. Ora o frio esperta o estômago. É preciso arranjar presigo que aquente. Como no dia de Santo André quem não tem porco mata a mulher, convém evitar a viuvez, sacrificando, sobre o banco esguio, à faca do matador, o cevado que no chiqueiro grunhe. A matança é um caso complicado que demanda conhecimentos domésticos. Até à dependura do porco e ao preparo da salmoura mestrejam os homens, mas os cuidados culinários do sarrabulho cabem às mulheres. O mulherio da casa e da vizinhança junta-se na cozinha a petar cebola para os chouriços, a fazer os rojões, a bater o sangue para o arroz de sarrabulho, a preparar o lombo e a colada, a lavar as tripas, a encher as farinheiras ou as alheiras, a depenar o galo (porque sem galo não há sarrabulho que preste) e a compor a vinha-de-alhos, enquanto as crianças contemplam a bexiga que, perto do lume, seca dependurada. Isto porque, nas casas boas das aldeias, o jantar de sarrabulho, bem regadinho de verdasco desde a canja até ao lombo, dura horas que nem Deus conta, e para mais, quase sempre com o senhor pároco à cabeceira.

Assim o homem se prende à terra e a agricultura e os cuidados caseiros entretêm a mulher. Mas sem os bois como se há de lavrar o campo? Quem dá o leite, senão as vacas? Não é também só de linho que se há-de compor o bragal. A lã dos carneiros e das ovelhas aquece mais. no Inverno, que o vinho das infusas. Os animais auxiliam o lavrador. É raro o que não sustenta bois, próprios ou tomados a ganho. Mas, além dos bois. há os porcos, as galinhas, as cabras, as ovelhas, o cão, que vigia toda a noite no quinteiro, o gato, que se enrosca na quentura do lar. É a mulher, quase sempre, que trata dos animais: encurrala as cabras e as ovelhas, faz a cama ao gado, tira o leite às vacas, escalda o farelo para as galinhas, prepara a lavadura para os porcos. Além disto. trabalha no campo como qualquer homem, em especial a casada de poucas posses, ou ocupa o tempo em indústrias caseiras, como a tecelagem e a fiação. quando se trata duma festa, não há ninguém como ela para enfeitar um arco de flores, para adornar um altar, para animar um leilão de prendas com segredinhos disputados, como não há ninguém como ela para amanhar uma ceia, tecer o linho, urdir, fiar. cantar, puxar os cordões à bolsa, calcular, rezar e descompor alguém.

Fonte: João da Rocha, Ilustração Portuguesa, n. 216, Lisboa, 11 de Abril de 1910

VIANA DO CASTELO: O QUE SIGNIFICAM AS TRÊS LIBRAS QUE A JOVEM MINHOTA EXIBE AO PEITO? – FOTO DE SÉRGIO MOREIRA E SÍLVIA MOREIRA

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Quase toda a gente já ouviu falar nos “três vinténs” – moeda que foi mandada cunhar pelo rei D. Pedro II – e que passou a ser utilizada para identificar a moça enquanto solteira, exibindo-a ao pescoço, um uso que foi com o tempo dando origem a expressões jocosas. Os três vinténs era uma pequena moeda de prata que valia 60 reis, que neste caso servia de amuleto e significava pureza e virgindade. Era feito um furo por onde se introduzia um cordão para a moeda ficar apensa.

Com o tempo, este costume foi sendo substituído pelo anel de aliança, neste caso para identificar uma situação de compromisso já assumida ou seja, o casamento. Em qualquer dos casos, prevenia situações desagradáveis que, um atrevimento por desconhecimento poderia redundar numa situação de pancadaria entre famílias.

No Minho, a moça casadoira exibia 3 libras do lado esquerdo do peito – o lado do coração. Está bem de ver que, sendo moça jovem e solteira – à época o casamento entre pessoas idosas não era bem-visto pela sociedade e dava origem a frequentes assuadas – trajava o seu melhor fato domingueiro, em regra de cores vivas e alegres.

Sucede que assistimos com certa frequência grupos folclóricos nos quais velhas matriarcas trajam com as cores mais garridas como se de moçoilas tratassem e, para cúmulo do ridículo, chegam a exibir as 3 libras – por vezes até 6 mais libras, 3 de cada lado do peito! Alguém porventura sabe o motivo?

VIANA DO CASTELO: REZA A TRADIÇÃO QUE FOI COM O TRAJE VERDE QUE GERAZ DO LIMA PRESTOU HOMENAGEM À RAINHA D. MARIA II – FOTO DE SÉRGIO MOREIRA E SÍLVIA MOREIRA

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Segundo reza a tradição, o traje verde de Geraz do Lima foi pela primeira vez confeccionado por volta de 1850, e apresentado publicamente por ocasião da visita da rainha D. Maria II àquela localidade do concelho de Viana do Castelo. Desde então, pela sua singularidade, não mais deixou de ser aparecer, destacando-se de entre os demais trajes tradicionais da região. Mas, apesar de já possuir 175 anos de uso, há quem questione a sua autênticidade como traje tradicional de lavradeira. Mas ele aí está, sempre representado pelos ranchos folclóricos e desfilando na Romaria da Senhora d’Agonia, em Viana do Castelo.

O AVENTAL DO TRAJE À VIANESA – FOTO DE SÉRGIO MOREIRA & SÍLVIA MOREIRA

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O Avental – O pintor José de Brito Sobrinho recolhendo-se, doente e desiludido à sua casa natal de Santa Marta de Portuzelo, ali casou com uma habilíssima tecedeira e para aumentar os rendimentos ao casal resolveu criar novos aventais. Pôs de parte os motivos geométricos (antigamente os aventais não apresentavam quaisquer bordados eram muito simples, com o tempo estes apresentam mais riqueza, surge as figuras geométricas como os losangos, triângulos e quadrados) e desenhou flores e folhas a preto, vermelho, verde e amarelo. Não admira que a novidade agradasse, pois os primeiros aventais eram lindíssimos. Após a sua morte, ocorrida em Fevereiro de 1919, outras tecedeiras continuaram o seu trabalho, deram-lhe novas cores, mas conservaram mais ou menos os desenhos por ele idealizados.

Fonte: Trajes de Portugal

TRAJE À VIANESA – FOTO DE SÉRGIO MOREIRA & SÍLVIA MOREIRA

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De uma forma genérica, o traje à lavradeira era a roupa que a mulher do campo usava nas suas lides diárias como em dias de festa e de romaria, diferenciando-se naturalmente a que empregava no trabalho da que guardava para ocasiões especiais. E distinguia-se ainda segundo a sua idade, estado civil ou estatuto social. Uma senhora mais idosa, uma avó ou uma mulher com filhos crescidos raramente usaria cores garridas.

Mas o traje antigo da mulher rural do Minho não era uniforme, variando ainda consoante a região – ou sub-região havendo modelos bem distintos para as localidades de Ponte de Lima, Areosa, Ribeira Lima etc.

Naturalmente, a vivacidade das cores e a beleza artística do traje usado nas zonas rurais à volta de Viana do Castelo despertaram a curiosidade da burguesia citadina e veio mais tarde a tornar-se no cartaz turístico de uma região.

"Traje à moda do Minho» ou «à Vianesa» (são estas as formas de dizer mais usadas no país, mas, por terras minhotas, usa-se especialmente a denominação de "Traje à Lavradeira") é um vestuário feminino, de festa, de «grande gala», apenas usado em dias assinalados e por moças de algumas aldeias do concelho de Viana-do-Castelo.

Em Viana-do-Castelo, quando se fala em de "Traje à Lavradeira", sem especificação alguma, entende-se em geral o «vermelho» das lavradeiras de Santa Marta de Portuzelo (na qual há também um belo «traje azul»), não só por ser aquele o vestuário o que mais agrada ao comum dos habitantes, pelo seu colorido quente e variado, mas ainda por ser o que a indústria caseira e o comércio local mais espalham na região

O traje vermelho ou azul são indistintamente usados pelas raparigas, mas quando casam quase sempre dizem adeus ao vermelho e passam a usar só o azul, quando se querem vestir de lavradeira.

Antigamente quando era divulgado o noivado, e nunca antes para se livrar de humilhação ou falatório se o casamento se desfizesse, a noiva dirigia-se à cidade “botar o ouro”, acompanhada pelos seus futuros sogros. Eram eles que ofereciam aquela que iria ser nora uma designada quantidade de ouro, correspondente às suas possibilidades económicas.

No primeiro domingo após este ritual, a noiva ia à Missa, exibindo o ouro oferecido, e vestindo o traje de lavradeira. Facilmente se detectava uma noiva pelos seus adornos e trajar."

Fonte: Trajes de Portugal

COMO VIU O ESCRITOR RAMALHO ORTIGÃO A MULHER DE VIANA DO CASTELO? – FOTOS DE SÉRGIO MOREIRA & SÍLVIA MOREIRA

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A aldeã do distrito de Viana é, por via de regra, tecedeira. É preciso não se confundir o que no Minho se chama tecedeira com o que geralmente se entende por teceloa. A tecedeira de Viana não se emprega numa fábrica nem tem propriamente uma oficina. Sabe simplesmente tecer como a menina de Lisboa sabe fazer crochet; e junto da janela engrinaldada por um pé de videira o seu pequenino tear caseiro, como o da casta Penépole, tem o aspecto decorativo de um puro atributo familiar, como um cavalete de pintura ou um órgão de pedais no recanto de um salão. A tecedeira trabalha mais para si do que para os outros nesse velho tear herdado e transmitido de geração em geração, e não tece servilmente e automaticamente, como nas fábricas, sobre um padrão imposto pelo mestre da oficina, mas livremente, como artista, ao solto capricho da sua fantasia e do seu gosto, combinando as cores segundo os retalhos da lã de que dispõe, contrastando os tons e variando os desenhos ao seu arbítrio. Tecer em tais condições é educar a vista e o gosto para a selecção das formas num exercício infinitamente mais útil que o de todas as prendas de mãos com que nos colégios se atrofia a inteligência e se perverte a imaginação das meninas de estimação, ensinando-lhes ao mesmo tempo como se abastarda o trabalho e como se desonra a arte.

(…) O marido minhoto, por mais boçal e mais grosseiro que seja, tem pela mulher assim produtiva um respeito de subalterno para superior, e não a explora tão rudemente aqui como em outras regiões onde a fêmea do campónio se embrutece de espírito e proporcionalmente se desforma de corpo acompanhando o homem na lavra, na sacha e na escava, acarretando o estrume, rachando a lenha, matando o porco, pegando à soga dos bois ou à rabiça do arado, e fazendo zoar o mangual nas eiras, sob o sol a pino, à malha ciclópica da espiga zaburra.

Fonte: Ramalho Ortigão in As Farpas

VIANA DO CASTELO LEVOU A LAVRADEIRA VIANENSE ATÉ À NORUEGA E À ISLÂNDIA

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Realizou-se uma sessão fotográfica por alunos do curso de fotografia da DTK, Escola de Artes em Bærum, em frente ao Palácio Real, numa colaboração que procurou divulgar a tradição do traje vianense no coração da Noruega.

A bonita Joana Oliveira foi igualmente fotografada pelas centenas de noruegueses e turistas que ali passaram e que elogiaram o traje e a sua simpatia.

Um especial agradecimento ao Diretor da DTK, Júlio da Silva, ao Professor de Fotografia Rui Dias e à Câmara Municipal de Viana do Castelo, pelo apoio que tornou esta iniciativa possível.

Fonte: Embaixada de Portugal na Noruega e na Islândia

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