BRAGA E O RITO BRACARENSE
Fonte: Terra portuguesa : revista ilustrada de arqueologia artistica e etnografia. N.º 31-32, Janeiro 1922
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Fonte: Terra portuguesa : revista ilustrada de arqueologia artistica e etnografia. N.º 31-32, Janeiro 1922
A Rede Europeia celebra de 1 a 15 de Outubro de 2023 a segunda edição dos “Dias da Rede Europeia de Celebrações da Semana Santa e Páscoa. Dada a boa aceitação da iniciativa no ano passado, em 2023, o período de celebrações decorrerá ao longo de quinze dias em vez de apenas dois.
Esta iniciativa, promovida pela própria Rede Europeia, tem periodicidade anual e dá a conhecer os valores culturais materiais e imateriais da Semana Santa fora da sua época celebrativa, para além de diversificar a oferta turística e cultural entre a população local e visitante de cada cidade.
Durante os dias em que decorrerá, cada cidade membro da Rede, apresentará cerca de trinta atividades que decorrerão em simultâneo nos espaços aderentes da iniciativa. Da programação constam visitas orientadas e visitas gratuitas a museus, visitas a ateliers de arte sacra e de criação artística contemporânea, concertos, degustação de gastronomia típica.
Toda a programação pode ser consultada no sítio oficial.
Mais sobre a Rede Europeia
A Rede Europeia de Celebrações da Semana Santa e Páscoa foi criada em 2019 e faz parte da Fundação Italiana Federico II, representando os municípios de Palermo e Caltanissetta, da Sicília, Itália; o município de Birgu, em Malta; a Comissão de Quaresma e Celebrações da Semana Santa, em Braga, Portugal; as Representações da Paixão de Cristo em Skofja Loka, Eslovénia; os municípios que fazem parte da rota Caminos de Pasión: Alcalá la Real em Jaén, Baena, Cabra, Lucena, Priego de Córdoba e Puente Genil em Córdoba e Carmona, Écija Osuna e Utrera em Sevilha. Também dentro da geografia espanhola encontramos Orihuela em Alicante; Lorca em Múrcia e Viveiro em Lugo.
Esta Rede tem como objetivo promover e divulgar o património cultural, tanto material como imaterial, relacionado com as comemorações da Semana Santa e da Páscoa, através de ações que valorizem este património, promovam o desenvolvimento turístico sustentável e contribuam para a salvaguarda do património imaterial através de trabalhos científicos e de investigação. Da mesma forma, o seu principal objetivo é unir forças e sinergias para consolidar um modelo de estudo, salvaguarda e divulgação do património das tradições da Semana Santa e da Páscoa na Europa.
Depois da folia a manifestação da Fé. Teve ontem lugar a solene procissão em Honra de São João d’Arga.
Fotos: Município de Caminha
A tradição cumpriu-se. Milhares de pessoas afluíram ao Santuário de São João d’Arga para cumprir as suas promessas, cantar e dançar e divertir-se bem à maneira minhota.
A Romaria de S. João d’Arga, uma das mais conhecidas e visitadas do concelho de Caminha. Todos os anos, após ano, após a subida ao monte, os peregrinos e visitantes mantêm a tradição de dar três voltas à capela, seguindo-se da entregue de duas esmolas: uma ao santo…e outra ao diabo!
A mais de oitocentos metros de altitude, em pleno santuário da natureza, situa-se a capelinha do S. João d’Arga, rodeada de quarteis onde se alojam os peregrinos. E, em redor, num sublime hino ao Criador, a vida selvagem revela-se em todo o seu esplendor. Os garranos apascentam livremente nos planaltos agrestes da serrania e a vegetação respira o ar livre das impurezas da civilização humana.
E, lá ao fundo, no velho mosteiro, a multidão agita-se e é vê-la noite inteira a pular e cantar ao desafio. Quem nunca foi ao São João d’Arga não conhece a verdadeira alma minhota!
Fotos: Município de Caminha
Há muitos, muitos anos, vivia na Serra d’Arga um perigoso salteador de estradas e casais, de seu nome Aginha. Por entre os arvoredos, caminhos e casas da Serra corria o temor de algum dia ser-se confrontado com tão perigoso meliante. A sua fama corria por todos os recantos, espalhando um misto de pânico e admiração. Já ninguém se atrevia a cortar a serra sozinho e, muito menos, de noite. Contavam-se histórias e histórias dos seus feitos, durante os serões da serra, ao calor das fogueiras. Os mais velhos, querendo o respeito e a obediência das crianças, ameaçavam com a presença do Aginha. Mas estas, depois da repreensão, preferiam brincar recriando as aventuras do malvado.
Quando menos esperava, o viajante via aparecer-lhe pela frente, de punhal em riste e chapelão, o malfadado Aginha! E se não levasse consigo fazenda ou moeda, passava um mau bocado, porque o assaltante só desistia da presa depois de a esbulhar, nem que tosse da roupa que trazia. Qualquer gesto de autodefesa era suficiente para a aventura não ficar apenas pelo roubo. Ao maltratar as vítimas mais intimoratas, Aginha marcava a fronteira do medo, e justificava a impunidade conquistada. Descia um dia, ainda noite alta, um frade do convento de S. João para a missa da matina em Arga de Baixo, quando o meliante lhe saltou ao caminho. A escuridão confundiu-se no hábito do frade. Aginha só reconheceu o homem de Deus quando o confrontou em pleno caminho. Mas Aginha não era homem de grandes rezas, e seria muito mau para a fama conquistada, se não fizesse o que sempre fazia nestes casos. Por isso, apontando o grande facalhão ao pobre do frade atónico, exigiu o salteador:
- A bolsa ou a vida!
A normalidade da sua exigência deu com a anormalidade do caminhante. O frade nem tinha bolsa, nem se preocupava muito com a vida terrena:
- Ó meu filho, não tenho nada de valor comigo, a não ser as pobres vestes de frade e a cruz que trago ao peito!
De que lhe serviam tais «trastes»? Nem umas botas ele trazia! Aginha não sabia o que fazer, pois tal nunca lhe havia acontecido. Vendo-o assim sem jeito e mudo, o pobre do frade lá foi conversando com o salteador, usando palavras mansas e sábias, às quais, perplexo, o Aginha, sentado agora, respondeu com um longo silêncio. Ainda hoje ninguém sabe o que o frade lhe disse! O certo é que, em puro milagre, decidiu abandonar aquela vida de salteador! Caindo aos pés do frade, banhado em lágrimas de arrependimento, confessou os seus crimes e converteu-se. Como penitência, impôs-lhe o frade a missão de permanecer na serra, ajudando agora aqueles que antes havia maltratado.
Poucos dias depois, passou por ali um lavrador, decidido a atravessar a serra com um carro de lenha. Ainda não era noite. Por isso, apesar de receoso, o nosso lavrador foi avançando apressado, como sempre fazia quando passava por tão mal afamado sítio. Na pressa não reparou numa grande pedra do caminho que, repentinamente, lhe tombou o carro em tremenda barulheira.
Não podia o dia ser tão azarado! Como podia aquilo acontecer mesmo ali! Depois de soltar dois ou três palavrões, sempre olhando em volta, assustado, decidiu o lavrador que a única solução era levantar o carro e atrelar novamente os animais o mais depressa possível. Mas como podia fazê-lo sozinho?
O estrondo do acidente atraiu Aginha. Vendo a incapacidade do lavrador, decidiu ir ajudá-lo, e assim dar cumprimento à penitência prescrita pelo frade.
Quando os olhos do lavrador deram com a figura conhecida do Aginha, sentiu que o sangue lhe fugia pelas pernas, e, por momentos, ficou petrificado, pois desconhecia a intenção do penitente. Julgava o lavrador que Aginha vinha para o maltratar, já que não o sabia convertido. Mais refeito da surpresa, e vendo-o sem guarda, pegou na machada de cortar a lenha, e desferiu-lhe um golpe na cabeça, que o matou.
Angustiado por tão hediondo crime, apesar de se julgar em autodefesa, arrastou o cadáver para o matagal mais próximo, e regressou, ainda assustado, à aldeia.
Passados dias, chegou à Serra d’Arga uma ordem do rei que prometia grande prémio a quem terminasse as aventuras do temível salteador, O lavrador, ao ter conhecimento desta ordem, e desejando fazer-se ao prémio, logo denunciou o seu feito heróico. Porém, chegados ao local onde tinha lançado o cadáver, povo e autoridades ficaram estarrecidos ao ver o corpo intacto! Aproximaram-se mais um pouco e, segundo dizem, sentiram que o corpo exalava um suave cheiro de flores silvestres, não obstante terem decorrido já alguns dias após o trágico desfecho. A estupefação só ficou mitigada quando souberam, pelo frade, da conversão do ladrão. Imediatamente o povo aclamou Aginha como santo, construindo ali uma capela em sua honra.
Fonte: https://www.altominho.pt/
Ponte de Lima realiza as Feiras Novas de 6 a 11 de Setembro. São festas grandiosas, das mais concorridas que têm lugar no Minho.
As Feiras Novas de Ponte de Lima – assim designadas para se distinguirem das “feiras velhas” ou seja, do mercado medieval cujas origens perdem-se nos tempos e que pela primeira vez aparecem referidas na carta de foral atribuída por D. Teresa em 1125 – foram instituídas em 1826, por autorização do rei D. Pedro IV, em assentimento ao pedido feito pelos moradores da vila no ano anterior.
A partir de então, a tradicional festa em honra de Nossa Senhora das Dores passou a incluir três dias de feira, com as suas atrações e divertimentos, acrescentando a componente profana às habituais celebrações religiosas.
As gentes de Ponte de Lima festejam a Nossa Senhora das Dores pese embora o orago seja Santa Maria dos Anjos. Tal como Braga festeja a S. João apesar do orago ser S. Geraldo. É algo bastante recorrente.
Em regra, todas as festas locais a que o povo adere e com as quais se identifica possuem na sua origem uma celebração religiosa, não raras as vezes com raízes anteriores ao próprio Cristianismo. As festividades cívicas (a religião cívica), apesar da sua justificação histórica, dificilmente encontrarão espaço na adesão popular. De resto, no caso vertente, tal decisão nem sequer foi submetida a consulta popular...
Os vianenses continuarão a honrar Nossa Senhora d’Agonia e os bracarenses o S. João de Braga consagrando-lhes os respetivos feriados municipais. Nossa Senhora das Dores cuja festa litúrgica se celebra a 15 de Setembro, deixará dentro de dois anos em Ponte de Lima de merecer as honras do feriado municipal. Em Viana do Castelo, continuará a ser invocada sob o nome de Nossa Senhora d’Agonia.
A tradição cumpriu-se! Durante a manhã, no âmbito da festa litúrgica de São Bartolomeu, as gentes Esposende em romaria à igreja do santo padroeiro da freguesia de Mar – São Bartolomeu do Mar – para invocar a sua proteção contra o medo e outros males atribuídos ao diabo como a epilepsia e a gaguez. E, lá estava o sargaceiro para ajudar as crianças a tomarem banho. Entretanto, vão em romaria levando consigo um galo preto.
Reza a lenda que, nesse dia, São Bartolomeu solta o diabo que durante o resto do ano traz preso, simbolizado num cão que mantém com uma trela.
É de origem remota a tradição do Banho Santo que se celebra na Romaria de São Bartolomeu do Mar, no concelho de Esposende, que a cada ano atrai maior número de visitantes àquela localidade minhota plena de tradições.
A romaria de São Bartolomeu do Mar aparece documentada desde o século XVI, muito embora evidencie marcas de ancestralidade, devendo muito provavelmente ter tido a sua origem nalgum culto a uma divindade numa época anterior à cristianização dos povos peninsulares. De resto, a associação do cão à representação do diabo remete-nos para a figura do cão tricéfalo guardião do Hades que nos é descrita pela mitologia clássica.
Com efeito, tudo leva a crer que estas práticas têm a sua origem mais remota nos ancestrais cultos pagãos em louvor das ninfas e outras divindades pré-romanas das águas ou ainda em rituais dedicados à deusa grega Ártemis – Diana na mitologia romana – cujos templos situavam-se geralmente junto a cursos de água. Ou ainda a Alfeu – deus do rio e filho de Oceano na mitologia grega – e a Posídon – Neputno, deus do mar na mitologia romana.
A tradição do Banho Santo ligado a rituais de purificação que têm na água a sua função primordial, é porventura aquela que confere maior significado a estas festividades e muito provavelmente a que se encontra nas suas origens mais remotas. De resto, a água está associada aos ritos do baptismo e às peregrinações a Santiago de Compostela. Mantido ao longo dos tempos pela devoção popular, tais práticas foram sujeitas a perseguições desde o século IV à época do imperador Diocleciano até à Idade Média. Acabariam, porém, por serem aceites pelo Cristianismo.
À semelhança de outras festas cíclicas, os rituais do Banho Santo tendo por objecto a purificação e preservação da saúde de pessoas ou animais levados pelos pastores, predominam em regra no meio rural, junto ao mar, a rios ou outros cursos de água. Para além da tradição em São Bartolomeu do Mar, no concelho de Esposende, temos ainda entre nós o “Banho da Degola” em louvor de São João da Degola que se realiza em Vila Real de Santo António, em Lagos, na serra de Monchique e os banhos de ano novo em Carcavelos e noutras localidades.
Com o decorrer do tempo, é possível que tenham ocorrido influências de várias culturas relacionadas com a presença de comunidades religiosas distintas, originando mesmo um certo sincretismo. É o que se verifica nomeadamente com o ritual de exorcização com recurso à galinha preta que muito provavelmente terá sido originado de uma influência mais tardia, muito provavelmente de raiz judaica.
Quando em 1496, o rei D. Manuel ordenou a conversão dos judeus ao Cristianismo sob pena de expulsão, existia em Barcelos uma comunidade judaica, à semelhança aliás do que sucedia noutras localidades minhotas como Braga, Viana do Castelo e Ponte de Lima. Refira-se que, à altura, o território que atualmente faz parte do concelho de Esposende era parte do termo de Barcelos, apenas tendo sido elevado à categoria de município com a atribuição do foral pelo rei D. Sebastião em 19 de agosto de 1572. Terão então os judeus conversos ou seja, os cristãos-novos que habitavam a região, adaptado a sua prática religiosa às que eram geralmente mantidas pela Igreja Católica a fim de serem tolerados no seio das comunidades locais, atitude aliás comum à generalidade dos judeus que permaneceram no país.
O Yom Kippur constitui uma das festividades mais importantes e solenes do judaísmo, destinada ao arrependimento e ao pedido de perdão, correspondendo ao Ano Novo no calendário hebraico (Rosh Hashana) e coincidindo geralmente com os meses de setembro ou outubro do calendário cristão. Nos dias que antecedem o Yom Kippur, praticam os judeus um ritual de expiação dos pecados (Kaparot) que culmina na matança de milhares de galos e galinhas, preferencialmente de cor branca como símbolo de purificação. O ritual propriamente dito consiste em elevar o animal sobre as suas próprias cabeças, dando com eles três voltas enquanto murmuram :“Esta é minha mudança, este é meu substituto, esta é minha expiação”, sendo de seguida degolado com recurso a faca de lâmina rigorosamente afiada, cumprindo-se desta forma o sacrifício.
Com efeito, para além das semelhanças existentes, a altura do ano em que os judeus praticam o Kaparot é praticamente coincidente com a realização da romaria de São Bartolomeu do Mar, da mesma forma que se constata terem os primeiros registos desta festividade surgido pouco tempo decorrido após o início da conversão forçada dos judeus ordenada pelo rei D. Manuel I, fatos que nos levam a acreditar na possível relação entre ambas as tradições.
Os romeiros levam os filhos transportando consigo ao colo uma galinha preta, dando três voltas em redor da capela antes de nela entrarem procederem á oferenda sacrificial, após o que colocam na cabeça a imagem de São Bartolomeu. Uma vez cumprido o ritual, encaminham-se para a praia onde terá lugar o “banho santo” das crianças nas águas gélidas e purificadoras do mar – aonde o diabo regressará ao anoitecer – que, com a ajuda do sargaceiro, é imersa por diversas vezes, contadas as ondas sempre em número ímpar.
Todos os anos, por ocasião da festa litúrgica a São Bartolomeu que se celebra a 24 de agosto, vão as gentes Esposende em romaria à igreja do santo padroeiro da freguesia de Mar – São Bartolomeu do Mar – para invocar a sua proteção contra o medo e outros males atribuídos ao diabo como a epilepsia e a gaguez. Reza a lenda que, nesse dia, São Bartolomeu solta o diabo que durante o resto do ano traz preso, simbolizado num cão que mantém com uma trela.
Fotos: Alfredo Cunha / Arquivo Municipal de Lisboa
A Romaria da Nossa Senhora da Peneda regressa com toda a normalidade de 31 de agosto a 8 de setembro.
O Santuário Diocesano de Nossa Senhora da Peneda voltará a receber os romeiros, peregrinos e turistas que aqui encontram a ligação perfeita entre a natureza, o património e a religião.
Nove dias de oração, de festa, de encontro, de ligação entre o passado e o presente, de ligação entre o popular e o erudito, de ligação entre o humano e o divino.
Trata-se de uma iniciativa da Câmara Municipal de Arcos de Valdevez e da Confraria da Nossa Senhora da Peneda.
Tradição única no Minho e em Portugal
É de origem remota a tradição do Banho Santo que se celebra na Romaria de São Bartolomeu do Mar, no concelho de Esposende, que a cada ano atrai maior número de visitantes àquela localidade minhota plena de tradições.
A romaria de São Bartolomeu do Mar aparece documentada desde o século XVI, muito embora evidencie marcas de ancestralidade, devendo muito provavelmente ter tido a sua origem nalgum culto a uma divindade numa época anterior à cristianização dos povos peninsulares. De resto, a associação do cão à representação do diabo remete-nos para a figura do cão tricéfalo guardião do Hades que nos é descrita pela mitologia clássica.
Com efeito, tudo leva a crer que estas práticas têm a sua origem mais remota nos ancestrais cultos pagãos em louvor das ninfas e outras divindades pré-romanas das águas ou ainda em rituais dedicados à deusa grega Ártemis – Diana na mitologia romana – cujos templos situavam-se geralmente junto a cursos de água. Ou ainda a Alfeu – deus do rio e filho de Oceano na mitologia grega – e a Posídon – Neputno, deus do mar na mitologia romana.
A tradição do Banho Santo ligado a rituais de purificação que têm na água a sua função primordial, é porventura aquela que confere maior significado a estas festividades e muito provavelmente a que se encontra nas suas origens mais remotas. De resto, a água está associada aos ritos do baptismo e às peregrinações a Santiago de Compostela. Mantido ao longo dos tempos pela devoção popular, tais práticas foram sujeitas a perseguições desde o século IV à época do imperador Diocleciano até à Idade Média. Acabariam, porém, por serem aceites pelo Cristianismo.
À semelhança de outras festas cíclicas, os rituais do Banho Santo tendo por objecto a purificação e preservação da saúde de pessoas ou animais levados pelos pastores, predominam em regra no meio rural, junto ao mar, a rios ou outros cursos de água. Para além da tradição em São Bartolomeu do Mar, no concelho de Esposende, temos ainda entre nós o “Banho da Degola” em louvor de São João da Degola que se realiza em Vila Real de Santo António, em Lagos, na serra de Monchique e os banhos de ano novo em Carcavelos e noutras localidades.
Com o decorrer do tempo, é possível que tenham ocorrido influências de várias culturas relacionadas com a presença de comunidades religiosas distintas, originando mesmo um certo sincretismo. É o que se verifica nomeadamente com o ritual de exorcização com recurso à galinha preta que muito provavelmente terá sido originado de uma influência mais tardia, muito provavelmente de raiz judaica.
Quando em 1496, o rei D. Manuel ordenou a conversão dos judeus ao Cristianismo sob pena de expulsão, existia em Barcelos uma comunidade judaica, à semelhança aliás do que sucedia noutras localidades minhotas como Braga, Viana do Castelo e Ponte de Lima. Refira-se que, à altura, o território que atualmente faz parte do concelho de Esposende era parte do termo de Barcelos, apenas tendo sido elevado à categoria de município com a atribuição do foral pelo rei D. Sebastião em 19 de agosto de 1572. Terão então os judeus conversos ou seja, os cristãos-novos que habitavam a região, adaptado a sua prática religiosa às que eram geralmente mantidas pela Igreja Católica a fim de serem tolerados no seio das comunidades locais, atitude aliás comum à generalidade dos judeus que permaneceram no país.
O Yom Kippur constitui uma das festividades mais importantes e solenes do judaísmo, destinada ao arrependimento e ao pedido de perdão, correspondendo ao Ano Novo no calendário hebraico (Rosh Hashana) e coincidindo geralmente com os meses de setembro ou outubro do calendário cristão. Nos dias que antecedem o Yom Kippur, praticam os judeus um ritual de expiação dos pecados (Kaparot) que culmina na matança de milhares de galos e galinhas, preferencialmente de cor branca como símbolo de purificação. O ritual propriamente dito consiste em elevar o animal sobre as suas próprias cabeças, dando com eles três voltas enquanto murmuram :“Esta é minha mudança, este é meu substituto, esta é minha expiação”, sendo de seguida degolado com recurso a faca de lâmina rigorosamente afiada, cumprindo-se desta forma o sacrifício.
Com efeito, para além das semelhanças existentes, a altura do ano em que os judeus praticam o Kaparot é praticamente coincidente com a realização da romaria de São Bartolomeu do Mar, da mesma forma que se constata terem os primeiros registos desta festividade surgido pouco tempo decorrido após o início da conversão forçada dos judeus ordenada pelo rei D. Manuel I, fatos que nos levam a acreditar na possível relação entre ambas as tradições.
Os romeiros levam os filhos transportando consigo ao colo uma galinha preta, dando três voltas em redor da capela antes de nela entrarem procederem á oferenda sacrificial, após o que colocam na cabeça a imagem de São Bartolomeu. Uma vez cumprido o ritual, encaminham-se para a praia onde terá lugar o “banho santo” das crianças nas águas gélidas e purificadoras do mar – aonde o diabo regressará ao anoitecer – que, com a ajuda do sargaceiro, é imersa por diversas vezes, contadas as ondas sempre em número ímpar.
Todos os anos, por ocasião da festa litúrgica a São Bartolomeu que se celebra a 24 de agosto, vão as gentes Esposende em romaria à igreja do santo padroeiro da freguesia de Mar – São Bartolomeu do Mar – para invocar a sua proteção contra o medo e outros males atribuídos ao diabo como a epilepsia e a gaguez. Reza a lenda que, nesse dia, São Bartolomeu solta o diabo que durante o resto do ano traz preso, simbolizado num cão que mantém com uma trela.
Fotos: Alfredo Cunha / Arquivo Municipal de Lisboa
Banho Santo (1995). Foto de Cristina Garcia Rodero
Banho Santo (1953). Foto de Artur Pastor
A tradição do Banho Santo foi notícia no Diário de Notícias em 28 de Agosto de 1982.
A tradição do Banho Santo foi notícia no Jornal de Notícias em 23 de Agosto de 1992.
Banho Santo (1953). Foto de Artur Pastor
Banho Santo (1976). Foto de Josef Kouldelka
Centenas de pessoas deslocam-se em peregrinação a S. Bartolomeu do Mar (Esposende), na crença de curar os diversos males através do banho santo.
Texto: Silva, Paula / Fotografia: Leal António
Fonte: O Diário. 26 de Agosto de 1989
E de novo, a história, a magia, a fé.
É bem conhecida a romaria do “banho santo” que no dia 24 de Agosto traz muita gente e muito povo e muitos turistas para este ritual.
É uma tradição religiosa que remonta ao Séc. XVI.
Reza o costume que no dia 24 de Agosto o “diabo anda à solta”. S. Bartolomeu guarda o Diabo (simbolizado pelo cão que está preso à imagem). Porém, neste dia, o Santo liberta o “bicho” e vai que tudo é permitido: mais folguedo, mais paródia, mais rixas, mais pancadaria, mais festa! O Diabo vai impregnar as águas do mar. O animal totémico, é a galinha preta que se oferece ao santo e que os romeiros comem também depois do banho.
O ritual consiste no seguinte: os pais dirigem-se à igreja com a criança que deve levar um frango preto nos braços; antes de entrar dão três voltas à igreja; segue-se a oferta, após o que colocam a imagem do S. Bartolomeu na cabeça. Depois, é a partida para a praia onde se vai passar o banho. A criança é, então, agarrada pelo banheiro (geralmente sargaceiros). O “banho santo” consiste em imersões que se devem fazer em número ímpar de ondas, 3, 7 ou 9. A imersão deve começar pela cabeça e é o banheiro que enxuga a criança antes de a entregar aos pais.
Depois, a família vai para as dunas onde come galinha preta.
Dizem que cura a “epilepsia” e outros “males” de crianças!
Francisco Sampaio in “Alto Minho – Região de Turismo”. Casa do Concelho de Ponte de Lima, Lisboa, 1997.
A Câmara Municipal de Ponte da Barca solicitou, hoje, a intervenção do Bispo de Viana do Castelo, no sentido de se resolver o impasse criado pelos párocos do arciprestado de Ponte da Barca, ao recusarem que os andores com as imagens dos padroeiros ou de outras devoções especialmente enraizadas nas diversas paróquias integrem, como era tradição, a procissão em honra de São Bartolomeu.
Na mensagem enviada ao Prelado refere que foi com “enorme surpresa e muita tristeza” que a Câmara Municipal tomou conhecimento desta decisão.
Trata-se de uma decisão incompreensível que está a “gerar grande estupefação e mal-estar no seio da comunidade, uma vez que trata de uma tradição muito acarinhada, que, no momento mais solene da Festa, leva em cortejo pelas ruas da sede do concelho uma lição viva de catequese e de afirmação da nossa identidade e cultura barquenses.”
Na mensagem enviada, o executivo solicita a D. João Lavrador o desenvolvimento, junto dos párocos de Ponte da Barca, das “diligências que considere adequadas, para que esta situação se resolva, em tempo oportuno, de tal modo que a procissão em honra de São Bartolomeu se possa realizar dentro dos parâmetros habituais.”