ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS VERSUS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS: O HISTERISMO E A DESVALORIZAÇÃO DO PODER LOCAL – CRÓNICA DE CARLOS SAMPAIO
O histerismo em torno das eleições presidenciais de 2026 está a abafar completamente um ato eleitoral muito mais próximo e com impacto direto na vida dos cidadãos: as eleições autárquicas de setembro de 2025.
Todos os dias, assistimos ao espetáculo mediático dos comentadores políticos, dos partidos e dos próprios potenciais candidatos à Presidência da República, numa espécie de corrida para ver "quem tem a pila maior”, como se diz na gíria popular. Um verdadeiro circo de egos onde a prioridade parece ser marcar território, quando, na verdade, estamos a dois anos das presidenciais e a escassos sete meses das autárquicas.
A questão que se impõe é simples: será isto uma manobra de diversão para esconder a falta de candidatos fortes e preparados para as eleições autárquicas”
O Poder Local: A Política de Proximidade Esquecida
As eleições autárquicas são o verdadeiro exercício de democracia. É nelas que se decidem os destinos das freguesias e concelhos, onde o poder está mais próximo das pessoas e onde se gere o dia a dia dos cidadãos. É aqui que se faz a gestão do território, se decide o futuro dos municípios, se constrói (ou destrói) a qualidade de vida das populações.
E, no entanto, os "histéricos" das presidenciais parecem ignorar esta realidade. Onde estão os debates sobre os candidatos às Câmaras Municipais e às Juntas de Freguesia? Onde estão as discussões sobre as propostas para o desenvolvimento das comunidades locais?
Mais grave ainda, muitas vilas e cidades estão presas a décadas de domínio pelo mesmo partido, como se fossem pequenas monarquias, sem renovação, sem visão e sem espaço para novas alternativas. Será que aqueles que se dizem tão preocupados com o país não veem que é ao nível local que muitas das políticas nacionais se concretizam ou falham?
Autarquias, Desenvolvimento Regional e o Papel das CIM
Além das Câmaras Municipais e das Juntas de Freguesia, há outro nível de poder local que influencia diretamente odesenvolvimento dos territórios: as Comunidades Intermunicipais (CIM). Estas estruturas coordenam vários municípios dentro de uma mesma região, definindo estratégias comuns para mobilidade, ambiente, economia e gestão de fundos europeus.
A articulação entre as autarquias e as CIM pode ser determinante para o futuro dos territórios, garantindo que os investimentos não fiquem bloqueados por disputas políticas e que as populações tenham acesso a melhores infraestruturas e serviços. No entanto, quantos eleitores sabem realmente quem lidera a sua CIM ou que projetos estão em curso na sua região?
Este desconhecimento reflete bem a forma como a política de proximidade tem sido desvalorizada. Enquanto se discutem as presidenciais até à exaustão, pouco ou nada se fala sobre aqueles que vão decidir, nos próximos anos, a gestão do território de norte a sul do país.
As Autárquicas Importam Mais do que o Circo Presidencial
É, no mínimo, lamentável que todos os dias se fale mais de António, Manuel ou Joaquim que podem ser candidatos a Belém, quando ainda não sabemos um décimo dos candidatos que vão lutar pelo poder local – esse sim, o verdadeiro rosto do Estado no dia a dia das pessoas.
O Presidente da República não asfalta estradas, não requalifica escolas, não cria zonas industriais, não decide os transportes públicos nem resolve os problemas dos hospitais e dos Centros de Saúde. São os autarcas que fazem isso.
Mas enquanto a histeria mediática continuar focada em quem será o próximo chefe de Estado, continuaremos a ignorar aqueles que realmente fazem a diferença: os Presidentes de Câmara, os Presidentes de Junta e aqueles que coordenam as políticas regionais.
Talvez seja tempo de parar de alimentar este espetáculo de vaidades e começar a olhar para o que realmente importa: quem vai governar as nossas terras nos próximos quatro anos.