"Padre de aldeia abençoando em dia de Páscoa" - Costumes portugueses da província do Minho. Autor: Augusto Roquemont (1804-1852)
A Pascoela ocorre sete dias após a Páscoa, sendo também designada por Dia da Misericórdia de Deus, oitava da Páscoa ou Quasímodo, denominações caídas em desuso após o Concílio Vaticano II.
Há mais de um século, o escritor e jornalista valenciano José Augusto Vieira, descrevia a Páscoa no Minho, na revista “Branco e Negro” (Semanario Illustrado), nº.1 de 5 de Abril de 1896, nos seguintes termos:
“O Natal é a festa da noite, a Paschoa e festa do dia!
Pelos caminhos da aldeia o parocho revestido de sobrepeliz e estola vae acompanhado pelo mordomo da cruz, pelo caldeirinha de agua benta, pelo campainha, pelo creado encarregado de receber os folares. Partem sol nado.
São muitos e distantes os logares, e a cruz, enfeitada com belos cordões de ouro e laços de fita coloridos, aromatisada com essência de cravo ou rosmaninho, tem de ser beijada por todos os freguezes.
Os vizinhos invadem uns as casas dos outros; os parentes teem de ir beijal-a a casa dos parentes, embora a distancia seja longa.
Avista-se além a Cruz, n’uma volta da azinhage. A campainha vibra no ar ambalsamado pelo perfume das macieiras em flôr, e então todos se dão pressa em juncar de flores e plantas aromaticas a entrada do seu lar, e estender sobre a mesa a alva toalha de rendas, onde o folar é depositado.
O padre chega. Enche-se a casa.
Alleluia, boas festas.
E a todos ajoelhados o parocho dá a Cruz para beijar, correndo assim a freguesia inteira.
Os ausentes teem vindo de fora, esquecem-se antigos ódios, visitam-se amigos velhos; a panella é gorda n’esse dia, o vinho espuma alegremente. É a natureza que ressurge, e quando a seiva ascende exhuberante e fecunda, não é para admirar que o espírito se vivifique pela alegria.”
SEM PÁSCOA NÃO HÁ PASCOELA
“Na Páscoa, o Cristianismo celebra a morte e ressurreição de Jesus Cristo, o que faz desta festividade porventura a mais importante e de maior significado para os cristãos. Com efeito, é a crença na ressurreição de Jesus Cristo que distingue a fé cristã em relação a outras confissões religiosas. Foi apenas no século II que a Igreja Católica fixou a Páscoa no domingo, sem a menor referência à celebração judaica. Sucede que Jesus Cristo, segundo o calendário hebraico, terá morrido em 14 de Nissan, precisamente o início do Pessach ou seja, o mês religioso judaico que marca o início da Primavera.
Com efeito, de acordo com a tradição judaica, a Páscoa provém de Pessach que significa passagem e evoca a fuga dos judeus do Egipto em busca da Terra Prometida. Na realidade, tal significação remonta a raízes ainda mais ancestrais, concretamente às celebrações pagãs que ritualizavam a passagem do Inverno para a Primavera ou seja, as festas equinociais associadas à fertilidade e ao renascimento dos vegetais.
Tais celebrações eram antecedidas pela Serração da Velha, o Entrudo e as saturnais que originaram as festividades de Natal. Mas, as novas religiões monoteístas alicerçaram-se sobre as ruínas das crenças antigas e, por cima dos antigos santuários pagãos ergueram-se as novas catedrais românicas e góticas. Da mesma forma que, sobre as ruínas dos velhos castros foram construídos os castelos medievais. E, assim, também as celebrações pagãs se revestiram de novas formas mais de acordo com novas conceções religiosas e se cristianizaram, adquirindo uma nova simbologia e significação.
Subsistem, no entanto, antigas usanças que denunciam as origens pagãs da festividade pascal associadas a costumes importados da cultura anglo-saxónica que, em contacto com as tradições judaico-cristãs originam um sincretismo que conferem à celebração pascal uma conceção religiosa bastante heterodoxa. É o que se verifica, nomeadamente, com toda a simbologia associada ao coelho e aos ovos da Páscoa, sejam eles apresentados sob a forma de chocolate, introduzidos nos folares ou escondidos no jardim, rituais estes ligados à veneração praticada pelos nórdicos a Ostera, considerada a deusa da fertilidade e do renascimento, por assim dizer a “deusa da aurora”.
Tal como para os judeus, a Pessach alude à passagem do anjo exterminador antes da sua partida do Egipto e, ao assinalarem as suas casas com o sangue do cordeiro levaram a que fossem poupados da praga lançada por Javé, para os cristãos é o próprio Jesus Cristo que incarna a vítima sacrificial ou seja, o cordeiro pascal que expia os pecados dos homens. Também para os cristãos, a Páscoa representa a passagem da morte para a vida eterna e o reencontro com Deus.
Na Páscoa, o sol primaveril irrompe pelas veigas verdejantes enquanto as árvores se espreguiçam num novo amanhecer. As flores exalam um perfume inebriante que inundam os céus e a todos contagia. As casas dos lavradores engalanam-se para receber a visita pascal. Junca-se o caminho com um tapete colorido feito de funcho, cravo e rosmaninho. O pároco, de sobrepeliz e estola entra pelos quinteiros, logo seguido a curta distância pelo mordomo, vestindo a opa vermelha e levando consigo a cruz florida que a dá a beijar, e o sacristão com a sineta e a caldeirinha de água benta. Lá fora, o estalejar dos foguetes indica o local exato onde segue a cruz. Em redor, a natureza renasce e adquire especial fulgor.
Fonte: Illustração Catholica, nº 45, Braga, 9 de Maio de 1914
O cabrito assado no forno constitui uma das especialidades da nossa cozinha tradicional que marca invariavelmente presença nas mesas dos portugueses por ocasião do domingo de Páscoa. A origem de tal costume perde-se nos tempos e possui as suas raízes em ancestrais hábitos pagãos, trazidos até nós através das influências judaicas e muçulmana.
Ultrapassado o período de abstinência alimentar e penitência da quaresma, eis que se celebra a chegada da Primavera e, com ela, o renascimento da vida e da natureza. Para os cristãos, a Ressurreição de Jesus Cristo, na senda doPessach, a Páscoa judaica, instituída na noite em que ocorreu o Êxodo do Egito e celebrada na Lua Cheia, no final do dia 14 do mês de Abibe; aproximadamente no ano de 1445 a.C.
Segundo o relato bíblico (Êxodo 12.12.13), Yahweh terá transmitido a Moisés: “E eu passarei pela terra do Egito esta noite e ferirei todo primogênito na terra do Egito, desde os homens até os animais; e sobre todos os deuses do Egito farei juízos. Eu sou Yahweh. E aquele sangue vos será por sinal nas casas em que estiverdes: vendo eu sangue, passarei por cima de vós, e não haverá entre vós praga de mortandade, quando eu ferir a terra do Egito”. A partir de então, passaram os judeus a celebrar a Festa do Cordeiro Pascal em memória do ocorrido. Não obstante, a tradição possuía origens bem mais remotas, sendo praticada ao tempo em que a maioria dos judeus eram pastores nómadas do deserto e celebravam a chegada da Primavera com o sacrifício de um animal.
Desde tempos imemoriais, a noção de sacrifício encontra-se associada à de dádiva a um ou vários deuses, podendo esta assumir as formas mais variadas. O cumprimento de uma promessa a um santo da devoção vem dentro da mesma linha de adoração com que os povos ancestrais sacrificavam um animal a fim de obter os favores divinos. Entre tais graças que se desejam obter encontram-se naturalmente a cura de certos males do foro físico ou psíquico e a expiação das culpas ou pecados, no entendimento de que o elemento físico e o espiritual não se encontram dissociados e constituem uma única dimensão. Por conseguinte, o sacrifício do animal, para judeus e cristãos representado no cordeiro pascal, mais não representa do que um ritual de expiação e de renascimento a que não é alheia o reinício do ciclo da natureza.
Cumprindo as profecias bíblicas, Jesus terá celebrado juntamente com seus discípulos a Última Ceia no dia 14 de Nisã, precisamente o dia em que os judeus imolavam o cordeiro pascal. E, desse modo, qual “cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo”, se ofereceu para ser crucificado e, pelo seu sacrifício, redimir os pecados dos homens.
Também os muçulmanos sacrificam os animais naquela que é considerada uma das mais importantes festas do islão – o Eid al-Adha ou Festa do Sacrifício. Esta celebração marca o fim do Ramadão e pretende evocar a disposição do profeta Abraão em sacrificar o seu filho Ismail em obediência a Deus, tendo Allah providenciado um cordeiro em sua substituição.
Em Portugal e, de uma maneira geral em todo o ocidente cristão, a Páscoa celebra-se no primeiro domingo de lua cheia imediatamente após ao equinócio da Primavera, variando portanto entre os dias 22 de março e 25 de abril, tendo a data sido fixada aquando do Primeiro Concílio de Nicéia ocorrido no ano 325 da Era Cristã. Também entre nós, por ocasião da Páscoa, é costume no domingo –dies Dominicusque significa dia do Senhor – sacrificarmos o cabrito ou o borrego no altar da deusaAbundantiaque, com sua cornucópia, espalha os alimentos que a terra fértil generosamente providencia. Trata-se de um costume ao qual não é certamente alheia também as influências judaicas e muçulmana que marcam simultaneamente a nossa identidade cultural.
O pão-de-ló e os tradicionais folares, os ovos e as amêndoas assemelhando-se a pequenos ovinhos constituem apenas algumas das iguarias consumidas durante o período pascal ligados a ritos de fertilidade associados ao início da Primavera.
Imagem alusiva à visita do compasso pascal, por volta de 1950, na freguesia de Antas, concelho de Esposende. Na foto vê-se o Padre Benjamim Salgado, que foi pároco de Antas, entre 1949 e 1956, e um grupo de paroquianos que o acompanham na visita às casas da paróquia, no dia de Páscoa, e que levam o compasso pascal, a caldeira de água benta e a campainha que anuncia a chegada do Crucifixo de Cristo.
Data atribuída com base na informação do Sr. António Azevedo, de Antas, Esposende. "Benjamim de Oliveira Salgado nasceu em Joane, Famalicão, a 08 de maio de 1916 e morreu em Joane, a 28 de janeiro de 1978. Compositor e regente de coros, é uma plurifacetada personalidade bracarense. Foi, além de pároco e compositor para a liturgia, professor de Canto Gregoriano, História da Música, Piano e Harmónio, no Seminário Conciliar de Braga, diretor do jornal “Correio do Minho”, fundador e diretor artístico de coros, diretor geral da Fundação Cupertino de Miranda, diretor da Casa de Camilo e, caso raro, Presidente da Câmara Municipal de Famalicão".
Fonte: Biblioteca Municipal Manuel de Boaventura | Entidade detentora: António Azevedo - Antas-Esposende
Entre 12 e 19 de abril, Ponte da Barca prepara-se para oferecer uma experiência única que combina tradição, fé e cultura, num trio de encenações que será enriquecido por música ao vivo, figurinos detalhados e iluminação especial. Cerca de 300 pessoas vão subir “a palco” num teatro religioso que ligará a história dos três Mosteiros Românicos à Semana Santa, levando os espetadores a cenários de profunda riqueza histórica e natural.
Todas as peças serão interpretadas por atores e figurantes locais, provenientes das diversas freguesias do município, criando uma atmosfera imersiva que transportará os espectadores para os momentos mais marcantes da história cristã.
O programa terá início no dia 12 de abril, às 21h30, no Mosteiro de Vila Nova de Muía, com a encenação de “O Sermão da Montanha”, que abarcará desde o nascimento de Cristo em Belém até à Sua chegada a Jerusalém.
Já no dia 17 de abril, às 21h30, a encenação de “A Dolorosa Paixão de Jesus Cristo” será realizada nos arredores do Mosteiro da Freguesia de Bravães, tendo por tema as últimas vinte e quatro horas de Cristo na terra.
Para o cair do pano, no dia 19 de abril, às 22h30, será encenada “A Ressurreição de Jesus Cristo” no Mosteiro Românico de São Martinho de Crasto.
Os três locais escolhidos para estas representações são verdadeiros testemunhos do legado do românico em Portugal, destacando-se não apenas pelo seu valor arquitetónico e religioso, mas também pela envolvência paisagística única que os rodeia. Entre monumentos nacionais, como em Bravães e em São Martinho de Crasto, e espaços de inegável beleza, cada encenação ganha uma dimensão especial, enriquecida pela aura intemporal destes mosteiros.
Programa das encenações:
“O Sermão da Montanha”, dia 12 de abril, 21h30, em Mosteiro - Vila Nova de Muía.
“A Dolorosa Paixão de Jesus Cristo”, dia 17 de abril, 21h30, em Mosteiro - Bravães.
“A Ressurreição de Jesus Cristo”, dia 19 de abril, 22h30, em Mosteiro - S. Martinho de Crasto.
Remonta ao século IV a origem da Semana Santa de Braga, sendo considerada a maior e mais antiga que se realiza em Portugal.
A Semana Santa, ciclo litúrgico mais importante do calendário católico, recorda os momentos que antecederam a prisão e execução de Jesus e culmina na Páscoa, na qual se celebra a ressurreição de Cristo.
Encapuzados e envergando túnicas negras – osbalandraus– cingidas por uma corda à cintura, o farricoco constitui a sua figura mais emblemática da celebração da Semana Santa. Caminham descalços e levam à cabeça uma coroa de sisal. Estas personagens, inspiradas no Antigo Testamento (cf. Jn 3,8), trajam em sinal de penitência, tendo este ritual origem nas antigas “procissões de penitência”.
Os farricocos levam consigo ruidosas matracas – osruge-ruge– encimadas em longas varas negras, fazendo-as girar e causando espanto a quem assiste à passagem da procissão.
Na Procissão do “Ecce Homo” os farricocos vão à frente, abrindo o cortejo, uma parte deles com as matracas que de vez em quando fazem ouvir, outra parte empunhando fogaréus. Assim fazem memória dos tempos em que andavam pelas ruas a chamar os “pecadores públicos” à “endoença” ou perdão da Igreja. O seu modo de trajar, por um lado, é sinal de penitência, e, por outro, serve para os esconder no anonimato. Na Procissão do Enterro do Senhor vão também a abrir o cortejo, mas em silêncio e arrastando pelo chão as matracas e os fogaréus apagados.
Os fogaréus são taças metálicas alçadas em altas varas negras e contendo pinhas a arder em grandes labaredas. Acompanham-nos alguns farricocos com cestas de pinhas para ir renovando o fogo. No seu conjunto são figuras tão exóticas e impressionantes que se tornaram, para muita gente, uma espécie de ex-libris da Semana Santa de Braga.
Fontes: Agência Ecclesia / Wikipédia
Farricos no procissão dos fogaréus (fotos de Artur Pastor)
A Via-Sacra no Bom Jesus do Monte, que se realiza todos os anos nos quatro primeiros domingos do tempo Quaresmal, é uma tradição profundamente enraizada na espiritualidade cristã e na vivência deste Santuário. Cada um é convidado a acompanhar os passos de Jesus Cristo a caminho do calvário; a refletir sobre os mistérios da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo.
Iniciando-se junto ao pórtico do Santuário, os peregrinos percorrem cada capela, cada estação, meditando sobre o sofrimento de Cristo. Momentos de oração, penitência e renovação espiritual.
O tempo quaresmal é um compromisso de fé para cada um de nós. Uma oportunidade de conversão e um apelo à vivência do amor e da misericórdia de Deus no dia a dia, de recebermos Cristo de braços abertos em cada um de nós.