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BLOGUE DO MINHO

Espaço de informação e divulgação da História, Arte, Cultura, Usos e Costumes das gentes do Minho e Galiza

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CÉDULAS FIDUCIÁRIAS DA CÂMARA MUNICIPAL DE BRAGA

O BLOGUE DO MINHO já abordou por mais de uma vez a temática das cédulas fiduciárias na nossa região, fazendo nomeadamente referência a cédulas emitidas pela Associação Comercial de Ponte de Lima, o Hospital S. José de Arcos de Valdevez e também da Câmara Municipal de Braga. Porém, para além do assunto suscitar particular interesse, encontramos uma nova cédula emitida pela Câmara Municipal de Braga.

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As cédulas fiduciárias constituem desde há muito tempo um dos objetos de interesse de colecionadores e estudiosos, nomeadamente por todos quantos se interessam pela numismática e notafilia, a nossa histórica económica ou simplesmente os aspetos da vida regional. Apesar disso, estamos convencidos de que as cédulas produzidas no Minho não mereceram ainda a atenção devida e são inclusive pouco conhecidas, apesar de surgirem alguns exemplares em leilões de colecionismo. É o caso dos exemplares de cédulas de cinco centavos que junto reproduzimos.

Regra geral, o aparecimento de tais cédulas verificou-se em momentos particularmente difíceis, de grave crise económica ou convulsão social, mormente durante a primeira guerra mundial, em resultado do encarecimento dos metais e consequente escassez de moeda corrente de baixo valor indispensável a pequenas transações. Esta situação era particularmente sentida fora dos grandes centros urbanos, situação que levou ao aparecimento do chamado "dinheiro de emergência" constituído por cédulas, cuja emissão fora a princípio apenas autorizada à Casa da Moeda mas que acabou por generalizar-se a inúmeras instituições oficiais e particulares, como câmaras municipais, misericórdias e até estabelecimentos comerciais.

Na cunhagem de moedas de reduzido valor facial, como sucede com as divisionárias geralmente utilizadas na realização de trocos, são empregues metais menos valiosos como o cobre, o alumínio, o níquel ou ligas constituídas por aqueles a fim de que mantenham um valor nominal superior ao seu valor intrínseco ou seja, em relação aos metais empregues na sua feitura. Sucede, porém, que quando ocorre uma subia do custo daqueles metais, recorre-se à emissão de cédulas fiduciárias a fim de evitar os elevados custos que a cunhagem das moedas implica em relação ao seu baixo valor nominal. Foi precisamente o que sucedeu nos finais do século XIX por ocasião da crise financeira resultante sobretudo da baixa do câmbio brasileiro, facto que gerou uma situação de pânico traduzida em falências, suspensão de pagamentos, corridas aos bancos e o quase desaparecimento de circulação das moedas em ouro e também em consequência da desvalorização da prata que levou quase à falência do banco londrino Baring Brothers que tinha acabado de conceder um empréstimo de oitocentas mil libras ao Estado português, facto que determinou a depreciação da moeda.

Também, durante a Primeira República, o crescimento da dívida externa com a Inglaterra resultante da participação na guerra e a inflação daí resultante associada à especulação com as divisas constituíram fatores que determinaram a depreciação da moeda, mau grado as diversas tentativas feitas no sentido do seu controlo que levou nomeadamente à criação da Junta Reguladora da Situação Cambial que acabaria por ter existência efémera.

O historiador Oliveira Marques deu-nos o panorama da crise financeira verificada com a implantação do regime republicano no nosso país. Descreveu-nos ele o seguinte: "Em 1911, o Governo Provisório introduziu o escudo, equivalente a 1000 réis e dividido em 100 centavos. Começaram logo os problemas com a estabilidade da nova moeda. O valor oficial de origem - 1 libra de ouro = 4$50 - nunca pôde ser mantido. Na verdade, já nos últimos anos da monarquias se iniciara a desvalorização da moeda nacional, com o 1$000 réis aproximando-se mais da quinta parte da libra do que do valor estabelecido. As desvalorizações atingiam 17 % quando começou a guerra. Daí em diante o escudo foi descendo gradualmente: 6$35 (1915), 11$57 (1919). Escasseavam as moedas, particularmente as de trocos, que se substituíam por cédulas de papel e cartão, dos mais variados tipos e feitios, emitidas pelas câmaras municipais, pelas misericórdias e outras instituições, e até por entidades particulares para seu uso privativo".

Com efeito, a partir de 1914, o governo autorizou a Casa da Moeda a emitir cédulas que se destinavam a substituir as moedas de cinco, dez e vinte centavos. Contudo, verificando-se que esta medida não era suficiente para suprir a escassez de moeda então verificada, acabaram por ser autorizadas as câmaras municipais a proceder à sua emissão com curso legal dentro da área dos respetivos concelhos. Esta prática viria contudo a generalizar-se com a emissão das referidas cédulas por parte de outras entidades. Citando ainda Oliveira Marques, "durante 1917, a escassez de moeda era já tanta que começaram a aparecer cédulas improvisadas, emitidas aqui e ali por todo o país, que a tentavam substituir. Frente ao abuso, o Ministério das Finanças decidiu ir ao encontro das realidades, determinando que a Casa da Moeda emitisse cédulas de 2 e 10 centavos e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa de 5 centavos. Simultaneamente, ordenava a retirada de circulação e a recolha de toda a moeda de prata do tempo da Monarquia, com a qual passou a dispor de reserva. Apareceram, pouco depois, as primeiras cédulas. A partir de 1918, o privilégio concedido à Santa Casa da Misericórdia cessou, cabendo também à Casa da Moeda a emissão de cédulas de 5 centavos. Mais tarde (1922) surgiram ainda cédulas de 20 centavos".

De aspeto bastante rudimentar, produzidas a princípio em simples pedaços de papel ou de cartão com as mais variadas dimensões, manuscritas ou impressas, com ou sem preocupação estética, as cédulas foram progressivamente melhorando a sua apresentação gráfica, acabando por revelar-se meios de propaganda turística e regional e, nos casos em que eram emitidos por estabelecimentos particulares, meios expeditos de publicidade comercial. Acerca da sua importância e aspeto, retemos a descrição feita pelo Professor Marcello Caetano: "...as emissões privadas continuaram, inundando o país de pequenos farrapos de papel, de formas e dimensões variadas, impressos ou litografados, com ou sem vinhetas, simples pedaços de cartão com o carimbo ou com a assinatura do comerciante e às vezes até, discos de lata com figuras e dizeres estampados a cores. Eram de um, dois, cinco, dez e mesmo vinte centavos, e até 1922 circulavam num meio mais ou menos restrito, conforme a importância do emissor, no concelho se era uma câmara, na clientela do estabelecimento se tratava de um negociante: verdadeira Notgeld cuja importância total se desconhece e é, já agora, impossível apurar".

Apenas a partir de 1924 foi possível travar a depreciação do valor da moeda e, desse modo, ir progressivamente reduzindo a utilização das cédulas. De acordo com Oliveira Marques, "Em 1924, Álvaro de Castro que juntara a Presidência das Finanças, conseguiu finalmente deter a marcha do escudo. (...) A legislação de 1924 reformou também a moeda metálica, aumentando o teor da liga e reduzindo o valor real das moedas. Aos poucos, foi sendo possível acabar com as cédulas de papel de ínfimo valor".

Também em Braga e no Minho em geral certamente não se fugiu à regra e aqui circularam cédulas de cinco centavos emitidas pela Câmara Municipal de Braga e devidamente numeradas. Provavelmente terão também circulado outras de diferente valor.

Bibliografia

- História de Portugal. Edição Monumental de Portucalense Editora, Suplemento I. Porto, 1935;

- Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Editorial Enciclopédia. Lisboa, Rio de Janeiro;

- MARQUES, A. H. de Oliveira. História de Portugal Contemporâneo. Economia e Sociedade. Universidade Aberta. Lisboa;

- MARQUES, A. H. de Oliveira. Breve História de Portugal. Editorial Presença. Lisboa, 1995;

- História de Portugal. Vol. XIV. Edita Ediclube Ld.ª. Amadora. 2004.

Carlos Gomes, in “Anunciador das Feiras Novas” (Adaptado)

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